domingo, 3 de novembro de 2013

O Resto é Mise-en-scéne! - por Giba Carvalho

    


A música brasileira vem apresentando um fenômeno diferenciado nos últimos tempos: a capacidade de autocopiar-se. No início do ano passado, fiquei atônito ao saber que os "cultuados" rapazes do Mombojó iriam lançar um disco com releituras dos "maiores sucessos" da "grandiosa" carreira de três discos. Isto já me deixou com a famosa pulga atrás da orelha. O primeiro disco da banda, intitulado "Nadadenovo", é audível e proporcionou aos rapazes o perigoso (e agora comum) status de "inovadores da cena musical". Depois deste disco, eu questiono aos leitores deste blog - "O que virou o Mombojó?" Na minha opinião, um emaranhado de agonia ao tentar mostrar algo diferenciado, que sacramentou toda banalidade dos trabalhos pós-primeiro álbum, com este compilado de aniversário. Aquela velha história - "já que não temos Nadedenovo, vamos enganar os trouxas com Tudodovelho".

Passado algum tempo, eis que surge em 2013 "Mundo Livre S/A vs Nação Zumbi". Um duelo entre as duas bandas que foram pedra fundamental para o Movimento Mangue Beat. Esta é uma idéia utilizada nos EUA, no fim dos anos 90, por bandas de punk e hardcore. Como costumo ouvir bastante bandas do estilo, ressalto a famosa "BYO SPLIT SERIES", iniciada em 99 e dividida em 5 volumes. O formato era um disco de vinil, onde cada banda tocava 6 músicas da outra em cada lado (Álbum Split). Para aqueles que pensam que os caranguejos pernambucanos inovaram com este duelo enlameado de sucessos do passado, afirmo que já no ano passado foi lançado outro álbum intitulado "O embate do século - Ultraje a Rigor vs Raimundos". Confesso que gosto da idéia destes "álbuns split", desde que os mesmos sejam meio e não apenas mais uma tentativa de manter-se vivo no mercado. A Nação Zumbi, como única banda de primeira grandeza de Pernambuco desde que o  Movimento Mangue-Beat foi criado, não precisa disso. Ao procurar algo para ler sobre este trabalho encontro o seguinte - "O encontro no disco 'Mundo Livre S/A vs Nação Zumbi', em que um toca as músicas do outro, é mais do que uma celebração do movimento e das suas canções. É um exercício dos mais interessantes, feito por duas bandas bem diferentes, no topo de sua forma artística."

É este tipo de conveniência que não aceito. Afirmar que ambas estão no "topo da forma artística" é uma piada de pura "brodagem". A Nação Zumbi, mesmo conseguindo manter-se no primeiro escalão, jamais conseguirá chegar perto da grandeza do que foi com Chico Science. Até porque, desde o excelente álbum de 2002, alterna trabalhos irregulares e um monte de lançamentos no formato "ao vivo". Promessa de disco novo na praça em 2014, após 6 anos de ausência. Já o Mundo Livre S/A é um caso à parte. A banda vive completamente de passado e da postura "comuna-intelectual" do "ilustre caranguejo" Fred 04. (Apesar de ter lançado trabalho próprio há menos tempo que a Nação Zumbi.)

Para completar o time, eis que me deparo com a seguinte manchete nesta semana - "Mallu Magalhães é encantadora - diz jornal The New York Times". Fiquei curioso e fui ler as reportagens por inteiro. Concordo que uma crítica no jornal americano deixaria qualquer jovem com muito orgulho de seu trabalho. No entanto, percebi claramente que não passa de mais uma jogada de produtores. Estes lançaram um álbum por lá intitulado "Highly Sensitive". O álbum nada mais é do que outro compilado das músicas dos três primeiros discos da garota cantadas em inglês. Ouvi o último álbum da moça diversas vezes. "Pitanga" (2011) é um álbum muito bem produzido e extremamente bem gravado. Kassin e Marcelo Camelo acertam em cheio nos arranjos que a garota precisa para desfilar toda a infantilidade (ainda?) e sua voz extremamente semitonada. Por falar nisso, a matéria acerta em cheio quando afirma que a mocinha não se preocupa com "o tom" e erra terrivelmente quando vê isto como algo positivo. Afirmo isto, porque com os aparatos que existem hoje em dia nos estúdios, qualquer "Mané" canta e qualquer "Maria" vira fenômeno. Agora, na hora da febre do ao vivo, é que podemos perceber do que de fato um artista é capaz. Voltando a pauta principal do texto, percebemos que estas jogadas estão se tornando cada vez mais usuais dentro do mercado. Neste caso em específico, porque Mallu Magalhães tem 21 anos, três álbuns e a vida toda pela frente. Inclusive, para aprender a cantar. 

O que nós fazemos? Apostamos em talentos não tão talentosos? Perpetuamos semi-Deuses criados por nós mesmos? Regredimos a arroubos juvenis para achar qualidade e graça na música?

As respostas para estas peguntas não são nada fáceis. Ache as respostas dentro dos ouvidos, de preferência, dando a verdadeira relevância ao que merece ser ouvido. O resto é mise-en-scéne!

Versão do disco - Pitanga (2011):



Versão ao vivo no Rock in Rio (2013):


2 comentários:

  1. Giba: Numa frase você resume tudo. "21 anos, três álbuns e a vida toda pela frente. Inclusive, para aprender a cantar. ".. Essa mocinha aí é o retrato do brasil musical de hoje. Assim mesmo, minúsculo, pequeno, retrô (no mau sentido), repetitivo e chato.
    Todo o atual estágio da música brasileira é de uma mesmice que me leva a desistir de dizer por aí que fui músico (profissional, aprovado em exame e inscrito na OMB-Regional Pernambuco sob número 2.067/66) embora de carreiras truncadas, mesmo porque eu tinha que ganhar o dinheiro do leite das crianças), compositor, produtor musical, tudo isso numa escala de estado fuleiro, como é Pernambuco, para os seus artistas. Como também é -frise-se enfaticamente- Pernambuco um estado altamente atabacado, abobalhado, imbecilizado, jogador de tapete vermelho pra tudo quanto é fuleiragem daqui e do resto do mundo. Ser artista em Pernambuco só exige o mínimo: cara de pau e "cenosidade" (muita gente talvez não saiba o que é isso, mas a galera aqui do blog sabe muito bem do que eu estou falando. Pois eu lhe asseguro: não vale mesmo a pena insistir e remar contra a maré da mediocridade. Melhor ir estudar violoncelo e piano até derreter o quengo, ouvindo, pra refrescar aquilo que nunca morre: eles, os inventores disso que chamam de música. Bach, Beethoven, Vivaldi, Scarlatti, Haendel, Verdi, todos eternizados no panteão da verdadeira Arte Musical. Todos criadores, pioneiros e atuais. E lembro, por necessário, sem desprezar as big-bands, os grandes jazzistas, seus maestros e arranjadores, criativos e também eternos.Parabéns pelo lúcido artigo.

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    1. Fred,

      Muito obrigado pelas palavras. Seus comentários são sempre de muita valia para todos nós que fazemos o Variações para 4.

      Abraço,

      Giba Carvalho

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